quinta-feira, 16 de abril de 2009

Cinderelas

E não há o que segure. Quem segure.

Quando criança a gente vive momentos em que tem vontade de chorar mas não pode. Às vezes porque é contrariado, outras porque a mãe nos repreende na frente de todo mundo e nos faz passar vexame, outras porque um amiguinho diz algo que nos magoa.

A gente tem vergonha, respira fundo, arregala os olhos e faz com que engulam as lágrimas de volta. Sopra pra cima, faz biquinho e tenta mirar o ventinho pra secar a gota que ameaça se formar. Não quer chorar de jeito nenhum. De jeito nenhum.

Esses momentos são muito raros depois que a gente cresce. Raros ao menos pra mim. Porque pouca gente tem o poder de me fazer chorar, e porque quando quero, choro mesmo, que se dane! Não seguro mais.

Sou um banana. Choro por tudo.
Sorte a minha. Sou intenso.
E com a mesma naturalidade eu rio de tudo.
Tenho até uma mania incontrolável de terminar frases com pontos de exclamação. Melhor pra mim.

Ai, ai, ai. Eu, eu, eu, eu... que ego!
Mas só posso falar de mim, já que não saio por aí fazendo pesquisas pra saber o que as pessoas sentem, o que pensam.

Curioso foi que nesta semana um querido amigo, que o destino não deixa sair da barra da minha saia e nem eu da dele, me mandou um e-mail com um link. A mensagem dizia: “Veja e chore!”.

Ele se senta ao meu lado no trabalho, mas me conhece muito bem e sabe dar às coisas o valor necessário para criar as expectativas que fazem toda a diferença quando queremos dividir algo com alguém.

Susan Boyle, uma senhora de 47 anos. Britain’s Got Talent, um tipo de American Idol inglês. Para não me estender na descrição de uma emoção que em parte eu prefiro reservar para a escuridão dos meus olhos fechados, eu sugiro que assistam ao vídeo antes de continuar a ler o texto clicando aqui.

Quando assisti ao vídeo voltei a viver um daqueles momentos de segurar o choro e descobri que ainda não sou adulto suficiente para chorar em qualquer lugar, a qualquer hora. Senti um delicioso prazer em reviver esta sensação. Uma nostalgia saudável.

Me sento numa mesa com mais 4 pessoas e em minha sala tem mais umas 8. Pensei que se eu chorasse ia ter que explicar, ia ter que dividir isto com pessoas que iam zombar, ficar ridicularizando o vídeo, e eu já me sentia dono dele e estava decidido a protegê-lo de todas as babaquices. E isto realmente aconteceu depois que o link se espalhou pela sala. O que para mim era uma cena tocante, para alguns era apenas mais uma chance de dizer idiotices. É por isto que eu ando evitando dividir as coisas de que gosto. Ando ficando cada vez mais egoísta. Assim como não tenho mais falado sobre cinema com quase ninguém. Me dou o direito de me poupar de aborrecimentos. Ando evitando pessoas e situações que me brocham.

Susan Boyle me fez muito bem. Por vários dias foi minha inspiração para tudo. Para seguir esses últimos dias que não tem sido fáceis. Para não desistir. Pra tentar outra vez e outra vez e outra vez... Para respirar fundo e escrever as próximas linhas.
Tenho prazer em escrever, mas não imaginei que trabalhar com isto fosse me trazer dias tão turbulentos que me tirariam o sono... Se este blog fosse meu trabalho seria muito mais fácil. (Mas por outro lado, não seria desafiador.) Escrevo aqui sem medo, e se eu escrever alguma bobagem ou ficar uns dias sem inspiração, ninguém vai perder dinheiro e nem eu o meu emprego. Rsss... (Olha o diário!!!)

Há momentos em que a gente não quer só derrubar uma lagrimazinha. A gente quer é soluçar, chorar e chorar e relaxar os ombros e pender a cabeça, ter a sensação de se derreter.

Acho que o choro é um dos índices de plenitude da minha vida. Chorei nos momentos mais felizes e nos mais tristes que vivi. O caixão da minha mãe passando na altura dos meus olhos, o primeiro orgasmo com o amor da minha vida, a execução da nona sinfonia de Beethoven de pertinho... chorei, e certamente fui pleno, fui verdadeiro, e há um alívio muito grande em ser verdadeiro. Algo como dever cumprido. Não deve ser à toa que o choro nos alivia.

Obrigado Susan Boyle. Você nem deve saber, mas deve ter feito muito bem a muita gente. Obrigado por ser minha Cinderela. Espero que o seu baile não acabe nunca.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Eu odeio telefone

Domésticas, o filme”, o primoroso longa de estréia de Fernando Meireles, contém diversas cenas que nunca vão sair da minha memória. Por que são muito boas e porque vi o filme umas 974 vezes.

Numa das minhas passagens preferidas Quitéria introduz: “Tem coisa que eu gosto, tem coisa que eu não gosto, depende da coisa.” E tem início então uma cena memorável que eu adoro reproduzir entre os amigos.

“Tem coisa que eu gosto, tem coisa que eu não gosto. Depende da coisa.”

Como é simples!!!
E a gente enrola tanto!!!

Desde os meus 8 anos eu estou, de uma forma ou de outra, envolvido com arte. E aos 14 eu comecei com as chatices de achar isso e aquilo desta ou daquela obra. Um malinha. Chatinho. Chatinho com potencial chatônico infinito.
E assim se passaram os anos, me envolvi mais a fundo com arte, com teatro, com cinema, com literatura, comecei e terminei a faculdade (imagine quanta chatice adquirida nesses anos todos... que medo!) Analisei as profundas linhas de tudo o que passou por mim, porque aprendi que analisar e pensar sobre a arte é algo inerente à condição de ser pensante - e é o que se espera de um estudante de arte e literatura. E foi tudo muito maravilhoso.

Porém, logo depois de abandonar o mundo acadêmico eu fui reler um livro que adoro. “Morte em Veneza” e nesta releitura surgiu um clic, um bip, um boom.

O trecho dizia algo mais ou menos assim: A gente fica sempre tentando justificar com referências, citações e embromações os nossos gostos quando, na verdade, o que nos atrai numa obra é a simpatia que temos por ela.
Gostamos, gostamos mais ou menos, não gostamos. É simples assim. O resto é balela justificativa.

Eu gosto do Titanic, eu gosto de Fala Mansa, eu gosto – muito – de desenhos animados.
Não gosto de “Cidadão Kane”, não gosto do Miró, não gosto de Stravinsky. Pronto. Falei!

(Nesta pequena lista estão apenas as arestas dos meus gostos. No mais eu sou relativamente previsível.)

Dias atrás ouvi do meu sobrinho: “Eu adoro prateleiras”.

Bom... cada um na sua, né?

Eu odeio tefefone. Já fiquei meses sem atender ao celular. Era uma delícia. Pra me achar só mandando scrap no orkut.
É algo muito forte isto. Ouço o triiimmmm e já imagino que é alguém pedindo um favor, me cobrando uma visita, querendo desabafar, só querendo dizer oi... ai, que saco!

“E aí, como cê tá? O que conta de novo?”
As minhas respostas eram mais ou menos assim:
- Nada. Nada de novo.
-A mesma bosta de sempre!
- Me deixa!!!!
- Uma merda... E tende a piorar... Sempre pode piorar. “Nada é tão ruim que não possa ser piorado”, já dizia Falcão.

E o amigo fica um tempo sem fazer contato.

Preciso me controlar... preciso me controlar...

Tenho um amigo que adora dizer “Gôndola”. Ele fecha os olhos e vive um deleite sem fim. Goooondola.

Tenho um prazer mórbido de dizer na fila da Mostra Internacional de Cinema que acho o Felini um chato. Que os filmes tem coisas lindas, mas que no todo são chatos, com exceção de "Satyricon" e “A estrada”. O povinho culturets acha que é heresia digna de fogueira.

Queria ver o Leon Cakoff dizer que é doido por “Parque dos Dinossauros”. (Será que ele é e nunca disse ou eu nunca ouvi?)

Deve ser uma delícia se sentar ao lado de um grande amigo e passar uma tarde esborrachado na guia, uma tarde de melancia que escorre caldinho pelo cotovelo, brincando de listar o que eu gosto o que ele gosta o que a gente não gosta.

E este é um dos meus grandes prazeres: assumir as minhas opiniões, revelar algo sobre mim que às vezes as pessoas não esperam.

É inegável que há prazer em ser algo... ser... em se ver e gostar do que é. Vejo nisto tudo uma graça deliciosa... e gosto de mim, na maior parte dos dias.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Retratação

A mocinha queria ser atriz. Foi fazer o teste para entrar em uma famosa escola de teatro.
Ela era talentosa. Mas não foi selecionada. Desistiu. Foi estudar psicologia.
O rapazinho queria ser pianista, ficou nervoso na hora do teste. Hoje é bancário.
Aconteceu o mesmo com as bailarinas telefonistas, os acrobatas balconistas, e tantos artistas que acabaram sendo outros “istas” que não estavam entre seus grandes desejos.

“Não. Você não pode ser o que quiser. Não há espaço para todo mundo.
Lamentemos.”

Por sorte a modernidade tomou rumos inesperados e acabou criando saídas para que pessoas que desejam se expressar possam fazê-lo sem que alguém lhes diga: “Sinto muito, mas você não serve para isto. Procure outra ocupação, outra paixão.”

Abençoada seja a Internet e seu infinito espaço para todas as abobrinhas do mundo!!!!

No meu texto anterior eu tentei tratar um pouco disso, mas acho que fiz de forma meio torta e fui muito mal interpretado. Parte da falha é minha, grande parte, mas parte é da falta de malícia e ironia dos meus queridos leitores.

Eu adoro brincar com os opostos. Quando me refiro à Adriana Lima eu brinco: “aquela moça feinha”. Aí está a graça pra mim. É como uma careta simpática. Mostrar a língua pra pessoas queridas.

Os blogs são uma bênção. Não uma praga.

Eles são uma fuga, um diário, um modo de se exibir, de se expressar, de divulgar o que se produz. Ele é tudo o que cada um quiser. Não há moderação, não há seleção, não á portaria, não pedem antecedentes criminais, não fazem consulta ao SPC. É o paraíso!!

Graças a este blog eu pude dar o meu passo inicial – não sei qual é o destino – e graças a ele eu recebi apoio, críticas, elogios e cheguei ao meu atual trabalho, que me dá tanto prazer.
Imagine se eu tivesse que esperar a aprovação, a permissão de um editor que me dissesse: “pare” ou “continue”. Quem sabe eu tivesse mais uma amargura pra incluir na minha coleção... oh, vida! Ai de mim! São tantas amarguras. Tantas mágoas. Tanta cara feia, tantos nãos.

Continuo achando muito chatos diversos blogs, muito mal escritos, nada pertinentes. Mas acho maravilhosa a possibilidade de todos poderem escrever e colocar à prova sua produção. E mesmo que não seja produção, mesmo que não estejam à prova, mesmo que estejam se lixando para o que pensam, mesmo que seja apenas desabafo, diariozinho.

Parabéns a todos nós que vencemos a preguiça e o medo e postamos aqui e acolá o que pensamos, as historinhas que imaginamos, as coisinhas que ouvimos. Parabéns por fazermos a alegria deste e daquela outra, e por botarmos lenha na fogueira, por darmos um tapinha no mundo para não deixar que ele se renda à senilidade. Porque o mundo é velho. Se a gente não agir ele se acomoda.