quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Flerte com a realidade

Era uma vez um menino.
Era pouco levado e meio contente.

Haveria na escola a comemoração do dia do índio. E a tia Damaris disse que “Quem quiser pode vir vestido de índio.”
Ele queria muito ir vestido de índio!

As coisas não eram fáceis naquela época e não havia quem cuidasse dele ou que se dispusesse a ajudá-lo com a roupinha de índio. Tinha seis anos, mas o tamanho dizia outra coisa. Miúdo com cílios gigantes. O cabelo ninguém se lembrava de levá-lo cortar. Um dia a Tia Damaris parou a aula, deixou as outras crianças copiando lição da lousa, sentou no fundo da sala e cortou seu cabelo que estava enorme. Ele lamentou muito perder de fazer uma lição tão gostosa. Era o dia de fazer “serra serra serrador, serra o papo do vovô” que sobe e bate na linha de cima e desce e bate na linha de baixo. Neste dia a tia lhe deu de presente, escondido dos outros é claro, um bombom. Ele escondeu na lancheirinha a pedido dela e seguiu a orientação de só comer em casa.
Tinha uma lancheirinha com desenho de uvas e morangos, na qual ele levava só meio pão todos os dias. Ele mesmo preparava e recheava com uma pelinha de margarina, que ele odiava.

O irmão mais velho, que tinha lá seus 14 anos - o único que ainda olhava pra ele - arrumou um tempo entre a escola e o trabalho e se dedicou a ajudar com a roupinha de índio.

Foram no terreno da frente catar folhas da ameixeira que estavam caídas no chão. “Pega só as que ainda estão verdes!”.
Pegou uma fita crepe, juntou as folhas e fez uma sainha de índio. As folhas batiam no joelho do menininho. Ele ficou tão contente! Tão contente! Não acreditava que ia mesmo de índio na escola!
O irmão também pintou o seu rosto com canetinha, fez um cocar com um pedaço de pano e grudou uma folha que apontava pro céu.
O menininho insistiu em ir descalço “A tia falou que índio não usa sapato!”. Mas o irmão explicou que ele tinha que ir de sapato e só tirar quando chegasse na escola... e não era pra esquecer de colocar na mala e trazer de volta.

Ele desceu a rua a caminho da escola pisando diferente... todos olhando pra ele e dizendo “Olha o indiozinho, que bonitinho!” E o orgulho o fazia abrir o sorriso e exibir os dentinhos podres.

Quando chegou na escola a tia Damaris deu um sorrisão e disse: “Mas falta um colar!” Puxa, o irmão se esqueceu de fazer um colar! E agora?

A tia tirou do seu pescoço um colar enorme feito de sementes, deu duas voltas e laçou a cabeça dele. “Ficou lindo! É o índio mais lindo que eu vi hoje!”

Havia muitos outros índios. Com cocares enormes de penas coloridas. E saias de estopa, muito bonitas, muito enfeitadas. Mas ele tinha tanta certeza de que era o mais bonito... não tinha como duvidar. A tia falou!!!


Naquele dia ele, que sempre era o segundo na formação da fila pra entrar na sala de aula, ficou na frente do Moacirzinho. “Hoje o Leandrinho vai ficar na frente da fila porque ele foi o único da classe que veio de índio, tá bom?!

domingo, 7 de dezembro de 2008

A festa nunca termina

Há mais ou menos 16 anos eu fui pela primeira vez na domingueira do Esporte Clube Salto de Pirapora. Das 20:30 às 00:00 h. Uma coisa de doido.
Como era bom!
Eu tinha lá meus 13 anos e a coisa mais gostosa da vida era esperar o domingo chegar. Passava na casa da Graziele e depois passávamos na Claudinha, às vezes na Elizandra, e íamos todos juntos. "Love for all seasons", "I Drove All Night", "Please Don't Go", "How do you do", "Love Is In The Air", "I want to break free", "Scatman's world", "Kiss Me" eram hits do período... qualquer um que ouvir uma dessas vai correr lá pra 1993.
O “clube”, como nós chamávamos, tinha regras que hoje me fazem rir muito. Pra se ter uma idéia, a pista era até dividida. Tinha cordão de isolamento invisível. Separava os descolados dos emergentes, e estes da “baianada”. Um fenômeno. Não havia intercâmbio. Não havia concessão.

(Outro fenômeno interessante que eu vou sugerir como tema para a National Geografic é que no carnaval de lá as pessoas rodavam na pista. Uma cosia doida. Como se fossem ponteiros de um relógio as pessoas rodavam abraçadas aos amigos... vá entender!)

Mas voltando à “baianada”... Adolescentes são maldosos, impiedosos. Tenho medo deles.A “baianada” dançava passinho, repetia a roupa dois domingos seguidos, era composta normalmente por pessoas mais pobres... e eles ficavam até meia noite. Nós, da turminha dos descolados - que tínhamos a carteira vazia também, mas fingíamos que não - íamos embora as 11:30. Era mais chique ir embora antes. Não ficávamos nem pra "sessão do bate-bate" - que era a hora em que tocava um rock mais pesado e as pessoas pulavam, se cabeceavam e se empurravam. “Que horror!!”.
Adorei esses anos, mas me envergonho das atitudes segregatórias e tolinhas.

Entao, há 16 anos eu comecei a sair pra dançar e ficar lá feito bobo.
Quer coisa mais boba do que ficar dançando só por dançar?

Que delícia! Com o tempo, passei a dançar e beber, e depois dançar, beber e beijar. E depois dançar e dançar e dançar e beber e beber e beber e beijar e beijar e beijar... rss... Como eu bebi! Como eu beijei!! Jisuis! Como eu dancei!

O horizonte foi se ampliando. Comecei a sair em Sampa, Campinas... Depois, trabalhando viajando por todo o Brasil, eu conheci todas as boates das capitais. Não fui ver as Cataratas do Iguaçu, mas fui na Taz.. rss.. E não conheci muitos pontos turísticos de diversas cidades porque nos domingos, meus dias de folga, eu estava de ressaca do sábado à noite.

Morando em Sampa por seis anos então... ah...eu me acabei! Quarta, quinta, sexta, sábado, domingo.

Em todas estas noites, no meio daquela fumaça, um desejo foi maior do que todos: eu imaginava meus amigos ali, meus sobrinhos, meu irmãos, meus amigos e amigas da adolescência. Eu os imaginava dizendo.. “Leandro, você tinha razão!! Aqui é bom demais! Que delícia!!” E nós fecharíamos os olhos e dançaríamos... O dia não acordaria e a festa não acabaria nunca.

Talvez eu possa oferecer mais às pessoas de quem gosto. Mas o que eu queria dar como presente para a vida delas é uma festa. Uma baladona. Não sei se seria o presente para a minha vida ou para a vida das pessoas. Isso se mistura bastante.

Ontem, depois de alguns meses metido a estudar muito e sem sair de casa, eu fiz uma baladinha. E lá no meio daquela gente destrambelhada e daquelas luzes que atordoam, eu cruzei com uma figura em quem eu tinha dado uns catas há onze anos... onze anos...

_ Caramba!!! Há quanto tempo!
_ Nossa!! Você se lembra de mim? Eu também me lembro de você!
_ Nossa... Muito tempo. Como é que a gente se lembra?
_ Somos marcantes! Rsss...
_ Estamos velhos..
_ Não somos velhos! Somos jovens há muito tempo!

Empunhei esta minha frase clichê que um dia ouvi do meu querido amigo Ivaldo de Carvalho. Devo tê-la ouvido lá pelos meus 15 anos. E a pratico. Pratico minha juventude há muito tempo, do meu jeito e pago lá meu preço por ela.

Hoje sinto um gostinho todo “tchan” ao dizer “há muito tempo”. No dia trinta de dezembro eu farei trinta anos. Faltam poucos dias.

Trinta no dia trinta.

Só acontece isso uma vez na vida. Parece que vai haver um eclipse, (mentira... rá rá rá...) houve quem disse que se abrirá um portal e que eu posso ter a chance de passar pro lado de lá. Uhu!!!

Trinta com corpinho de vinte, e carinha de vinte e três (Se achando) muita gelatina, uma linha de uns 657 cosméticos, academia, salada, pouco açúcar e nenhuma gordura. E uma baladinha mensal com direito a imersão em alcool.

Tudo isso pra tentar ser jovem por mais uns trinta pelo menos.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Let the seasons begin

Pois é... que coisa...
E cabia tudo num pequeno jardim. Tudo.
E as plantas ensinam o tempo das coisas.
A metáfora já gasta do “semear, regar e colher” ainda pode dar frutos... rsss...

Ontem vi “Muito além do jardim”. Um filme dos anos 70 que eu tinha o título na mente mas acho que misturava com outro que tinha jardim e achava que já havia visto.

Bom demais!

Na minha linha histórica do cinema há uma lacuna de décadas... 40, 50, 60, 70... Conheço bastante do que se produziu no início do século, e dos anos 80 pra cá. Acho que esta época esteve entupida de musicais e chatices que eu não gosto e por isso deixei de lado por puro preconceito.
De uns tempos pra cá tenho dado oportunidade a alguns títulos e tenho tido ótimas surpresas. "Chinatown", de Roman Polansky, é um filmão que não tem nada de supimpa no tema, mas que é uma coisa de doido de lindo e bem dirigido. E tem a atuação primorosa de Fay Danaway, uma das minhas atrizes preferidas.
E ontem, “Muito além do Jardim” me rendeu lágrimas, deleites e reflexões deliciosas.

Adoro quando as reflexões são fluentes. Não sei se dependem da obra ou da nossa predisposição. Recordo-me de um professor que tive na USP, o “Vilaça”. Logo no início do seu tempo de professor uma aluna toda espertinha perguntou a ele: “Professor, se a poesia é a excelência da linguagem, se é a melhor forma de dizer algo, porque é que nós aqui temos que ficar ainda discutindo e a analisando?”. Ele ficou sem resposta.
Uns anos depois, percebeu que a resposta era óbvia, e se odiou por não ter respondido naquela hora.
Pensar sobre o que se vê, se vivencia, é inerente à condição de ser racional... sensível aos estímulos do mundo.

Eu estendo este pensamento à idéia de que pensar sobre o que se vê pode não estar apenas relacionado ao exercício de racionalizar um momento, uma sensação. Acredito que ainda mais interessante seja a percepção do que se sente. A consciência da experiência.

Sempre digo que o que me chama demais a atenção na arte são as coisas que me deixam extasiado e que não são claras e óbvias de início. Adoro as loucuras do David Lynch, do Kieslovsky, do Greenaway. Estão além da arte representativa. Encenam muitas vezes sensações, sentimentos. Filmam o impalpável.

No filme de ontem eu logo nos primeiros minutos pensei: “hum... isto não é um filme. Isto é música.” E era mesmo! A maior parte do filme era música.
Música a gente deixa entrar, não pensa nas barbaridades, na interferência de um instrumento novo... e tudo caminha bem. E não é preciso entender, concordar, racionalizar.

Quase consigo envolver o filme numa esfera metafórica bem simples - clichê e simplista também -
Um jardim mesmo. Um jardim com música talvez.
Pode parecer conformista e pequeno. Mas talvez não haja melhor forma de fazer as coisas caminharem bem, caminharem tranquilamente, seguirem seu curso.

As estações vêm, a gente querendo ou não.

Não podemos controlar o mundo. Mas regar, adubar e podar nos períodos certos, sim. Ao menos o nosso mundo. O nosso dia.

Eu sei. Não somos plantas.
Mas... “Let the seasons Begin!”
Vou tentar ser mais jardim ouvindo a música que tem este verso num refrão. “Elephant Gun” do Beirut. Tô viciado!!

(O link !Elephant gun" leva ao clip no youtube. Mas ele não é bom acho que até atrapalha a música. Feche a janela e ouça só a música. Acredite em mim. Depois de ouvir a música ao menos uma vez eu deixo você ver o clip, ok? Rsss... Já o link da banda, "Beirut", leva a um vídeo e música maravilhosos. Confira!)

domingo, 30 de novembro de 2008

Macarronada Monumental

_ Alô!
_ Viu, queria te pedir uma coisa!
_ Diga!
_ Cê pode trazer um litro de leite quando vier? É pra fazer o molho branco.
_ Ok. Levo sim! Podexá!
_ Tá. Tchau!
_ Até!

Xi! Esqueci de perguntar se era desnatado ou integral!!

Ela tinha trazido da viagem à Europa um pacotinho de macarrão com formato de monumentos Italianos. Cada um de uma cor, vistosos - que pra mim tinham cara de doce de abóbora. Ah, tinham!

Pistache, castanhas, amendoim, vinho, cerveja, coca-cola... aguardando o macarrão e a salada. Até aí tudo bem convencional. Mas então eis que uma novidade brotou: chegou uma mocinha com um quibe vegetariano. Não, ela não disse que era vegetariano. Mas era sim. Eu sabia que era. Só podia ser.
Era uma mocinha com tudo longo. Um vestido longo, um cabelo muito longo e numa das orelhas um brinco de pena muito longa. Uma mocinha de uma beleza que só se pode ter até os 25 anos. Soube que tinha 27. Mas não importa. Só se pode ter esta beleza até os 25. Mas ela tinha 27!!!!! Não - im - porta! Há a idade do tempo, a idade do que se sabe e a idade da cara.
O rapaz que a acompanhava, simpático e agradável até não querer mais, trouxe um matinho que lembrava rúcula, mas que segundo ele mesmo, amortecia a língua. Ingrediente corriqueiro nos pratos do Amapá, sua terra.

Em seguida chegou o casal todo serelepe com a lichia.
Lichia? Sim lichia! Um sacão cheio!!
Nunca tinha comido lichia, e como tava demorando o tal macarrão resolvemos experimentar.
E um dá dica de que se tira a casca assim... outro diz que tem gosto que lembra isso e aquilo... E uma das convidadas preambulou..

_ Posso falar besteira?

Estes preâmbulos são sempre sinal de bomba, e há na história raríssimos registros de que receberam um não como resposta.

_ Pode!
_ Pode, claro!

Um bando de gente pervertida e curiosa! Claro que queriam ouvir! Ahahaha...

_ Dizem que tem gosto de (piiiiiiiiiii...)

Fez-se silêncio.
Um corou aqui, outro ali. Outro fez cara de nojo, outro levantou assustado a sobrancelha. Da boca de alguém deve ter minado água.
Até eu que sou meio boca-suja arregalei de levinho os olhos.

Teve gente que desistiu ali. Trauma forever de lichia.
Ela ficou toda culpada. Arrependida.

_ Que nada! Relaxa!

E veio a anfitriã..

_ Gente, antes de colocar o macarrão na água fervendo eu queria dar pra cada um de vocês um macarrãozinho de lembrança!
_ Eba!!
_ Eu quero o Coliseu! O Coliseu é meu!
_ Eu quero a Torre de Pisa!
_ Eu quero a Torre Eiffel!
_ São só monumentos italianos!!!!!
_ Ahn! Hum... então quero... quero... ( xi, ele não lembrou de mais nenhum!)
_ Ai, brigada!!! Eu vou guardar com carinho até juntar caruncho!
_ Vou ser bem honesto: tem legenda no pacotinho dizendo o que é o que? Isto aqui não se parece com nada!
_ Deve ser o mapa da Itália!

Falamos sobre a Itália, sobre viagens e é claro que a história da moça no banheiro do metrô veio fazer uma visita looonga ... rsss...
A vítima e a testemunha estavam presentes e queriam dar a sua visão do acontecido.
A vítima, já meio empolgada pelo vinho, começou a encenar o ocorrido. E por algum motivo tinha na mão um pedacinho de bambu... - detalhe pra deixar a cena mais non-sense. Para alegria deste que aqui escreve - e gesticulava pra cá e pra lá e gritava e esquecia que já passavam das 10 h. E corria pela sala e parecia uma baliza em frente à bandinha. Sem largar o bambu. E às vezes o girando nos dedos.

_ Xiu, gente! Daqui a pouco o porteiro interfona pedindo pra não fazermos tanto barulho!

_ Olha só que guloso!! Que pratão colorido! Vermelho, branco, verde, quibe!
_Quibe não é cor!
_ Olha só! Tá dizendo que seu quibe não tem cor definida!

Devia ser por conta da grande variedade do tempero.

Na festinha as pessoas faziam sua parte na mistura da noite. Um era uma fruta, outro uma massa, outro um tempero exótico, uma salada que dá barato, e o álcool dava a liga. Na medida certa. Todo mundo, é claro, querendo ser a folhinha que dá barato.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Se rebolar é viver eu vivo porque rebolo você.

Aquele solzão torrando meus ombros, o copo suado da cerveja pingando na minha barriga uma gotinha gelaaaaada... meu umbigo inundado...
Onda vai, onda vem.
Passaram por mim “Hermes de Biquíni”, passaram “As quatro bichas fantásticas”, “O senhor com o refletor”, “A pequena menina de 1,80 m”, “O feio que só tinha amigos bonitos”, “O Homem chorão”... Passou o mundo por lá naquele dia.
No cantinho havia “O tambor do ombrinho e do biquinho”.
Passou por lá o vendedor de bugiganga e eu comprei uma pulseirinha. Pedi para que o rapaz a amarrasse no meu braço direito, fiquei assistindo e sorrindo. Ele me perguntou:

_ Tá feliz, é?
_ É... Tô... E tenho certeza de que tem gente me esperando voltar pra casa com uma pulseirinha nova no pulso.

O Rafa não é lá muito de prestar atenção em detalhes. Mas acabou notando e dizendo num misto de elogio e deboche:

_ Hummm...Outra pulseirinha!!

Acho que no fundo voltei de Salvador meio árvore de natal, coberto por pulseiras e braceletes, anéis de mil brilhos, tornozeleiras, colares, tatuagens por todo o corpo e até tererê e rastafari nos cabelos que não são lá muitos.

Sempre que viajo à praia eu entro num clima caiçara. Acho um charme voltar pras terras de cá com um ar praiano, colarzinho, bronzeadinho, pulseirinha, tatuagem.
Semanas depois eu enjôo do colar, as pulseiras ficam fedidas, a tatuagem desaparece, o bronzeado some e eu volto a ser como antes.

Voltei com apenas uma pulseirinha de pano, mas a memória veio cheia de jóias.
A memória dos metais dura mais.

Estava lá sozinho, sem conversar, com tempo para observar.
E fiquei a observar, observar, observar... e a sorrir para as coisas e para as pessoas... das coisas e das pessoas... e a me emocionar com elas.

Sou um ateu de araque. E por isso vejo Deus em várias situações, em vários momentos.

Deus tava por lá. O vi de relance várias vezes se esgueirando pelos coqueiros, pelos pilares dos quiosques, servindo cerveja para algumas mesas. Caso ele exista mesmo, deve estar em lugares como este, e não nos mosteiros sombrios e escuros, castigando e punindo as pessoas. Acho mais provável que esteja ao lado dos felizes reboladiços e não ao lado das carolas preconceituosas e de coração peludo que são incapazes de um gesto de amor ao próximo.

Pelo que tenho ouvido das pessoas com quem falo pelo meu encanto com Salvador, todo mundo volta de lá “meio assim”... Eu acho que voltei “três quartos assim”... no mínimo.
Parece que lá houve um encaixe, parece que os meus botões se fecharam mais facilmente, escorregaram casa adentro, e eu fiquei alinhado, ereto.

Estou com a impressão de que Salvador é salvador mesmo. E eu que nem achei que estivesse precisando ser salvo nestes tempos.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Flerte com a ficção

Um vulto se aproxima e quase molha minha orelha:

_ Você é muito bonito, sabia?
_ Obrigado! - No susto, sempre rola uma simpatia espontânea.
_ Muito gatinho mesmo.
_ Obrigado! – Como quem diz “tá bom... já falou!”
_ Você tem um sorriso lindo! Um sorriso maroto... E essa barbinha então... Hummm...
_ Hãn! – Som de quem não quer conversa.
_ Faz tempo que eu to de olho em você.

Eu só sorri sem desgrudar os lábios e levantei as sobrancelhas como quem diz... “que coisa, não?!”. E ele continuou...

_ Você é de onde?
_ Sou daqui.
_ Daqui onde?
_ Daqui. Daqui. – Apontei para o chão. A impaciência estava escapando.

_ Você tem olhos lindos. Amendoados. Profundos. Ascendência oriental?
_ Não.

Eu com olhar dizia “Olha, sua abordagem é péssima e eu não estou a fim de papo.”

_ Eu acho que o olhar diz tantas coisas. Ainda mais olhos como os seus.

Pelo visto meu olhar dizia coisas que os olhos dele não ouviam. Sinestesia de araque!

_ Difícil conhecer carinhas assim, como você... simpáticos, agradáveis.

Meu Deus, mas eu não havia dito nada até então!!!! É o cúmulo da simpatia fazer cara feia, ficar em silêncio e ainda passar por simpático.

_ Coisa doida, né?
_ É. – A que ele se referia???
_ A gente se cruzar aqui, assim... Quem diria?

Eu e meu olhar incrédulo.

_ E eu que dava minha noite por perdida.

O cara viaaaaaja!

Uma das portas se abriu e chegou a minha vez de ir ao banheiro. Acenei com um gesto indefinido e parti.
Ao longo da noite nos cruzamos mais umas duas ou três vezes. Sempre via aquela cara “Olha eu aqui outra vez!”, “Mundo pequeno, hein?!”, “Pelo jeito o destino quer mesmo que a gente se cruze!”.

Os minutos correram. A noite e o álcool levantam todos ao mesmo nível.

Houve um momento em que por segundos nos olhamos mais demoradamente. Não sei o que me deu.
Sorriu pra mim. Um sorriso matinal na minha madrugada barulhenta. Um sorriso de cumplicidade que talvez tentasse dizer “Que loucura a nossa... aquele romance na fila do banheiro. A gente é doido, né? Noite doida!”

Romance? Mas ele estava praticamente falando sozinho.

E eu mal pensei e já amassei e joguei fora, testemunhando a luta do sensível contra o insensível... “Sim, noite doida!”.

domingo, 16 de novembro de 2008

Come back "Rossé"!

Na noite de ontem, véspera de uma prova terrível que teria hoje, eu, mais uma vez, dormi de janela aberta.
Tenho quase oito graus de miopia, tiro as lentes de contato pra dormir e dependo dos óculos pra saber que o mundo existe.
Deitado na cama ansioso e quase triste eu olhei pro céu e decidi fazer um pedido a uma estrelinha. Sou muito cético, mas tenho grande apreço pela beleza da poesia das superstições.
Sem os óculos não conseguia ver nenhuma estrela no céu. O sono estava chegando e eu morrendo de preguiça de esticar o braço e apanhar os óculos no criado ao lado da cama. Cheguei a cochilar. Acordei com o sustinho da vigília, decidi vencer a preguiça, pegar os óculos e fazer o tal pedido à estrelinha. Não consegui ver nenhuma. Mas fiz o pedido assim mesmo. Ao céu... ao léu.

Fiz o que pude na prova. Tinha muita coisa que eu sabia, que gostoso! Estudar dá nisso!! Rsss... Mas o pedido que fiz à estrelinha escondida veio a se realizar de uma forma inusitada no fim da tarde.
Demos um tiro no escuro e decidimos ver “Um dia sem mexicanos”. Tento ler sobre o que rola no cinema e tal, mas não me recordo de ter ouvido falar deste título.
O mais gostoso da festa, mais até do que esperar por ela, é não esperar nada e ter a grata surpresa de muita diversão.

Há alguns filmes que eu vejo, me debulho em lágrimas e fico em estado de catarse por algumas horas, às vezes por uns dias. Eu choro por mais de um motivo: choro porque me comovo mesmo com a história de vida dos outros, mas talvez haja um motivo mais forte... comovo-me porque sei que a obra de arte é o resultado do esforço de um ser humano. Não se trata de mágica. Não se trata de acaso. Um compositor se debruça nos seus pentagramas e cria uma música, depois mais de cem pessoas se juntam e, sob a batuta de um maestro, executam uma "nona sinfonia".
No cinema não é diferente. Centenas de pessoas se juntam e nos iludem direitinho nos fazendo crer que aquilo é verdade. Que coisa...

“Um dia sem mexicanos” é um filme divertidíssimo, surreal. Uma caricatura delicada e sensível da questão da imigração latino-americana nos Estados Unidos. A abordagem aparentemente despretensiosa da narrativa contribui muito para que a reflexão sobre a questão seja tão espontânea: de um dia para outro todos os latino-americanos, no filme chamados todos de mexicanos, desaparecem misteriosamente do estado da Califórnia. “Tragam meu chiuaua de volta!!” rá rá rá...
Tal acontecimento toma forma de tragédia e trás consigo toda a sequência de fatos que a acompanham, como a mobilização da população e exploração inescrupulosa da mídia. Ri muito. ( O gosto pelo espetáculo da desgraça alheia parece ser compartilhado mundo afora. Izabela que caiu da janela e Eloá que já não está mais por cá não me deixam mentir.)
Fez-me lembrar muito “O anjo exterminador” de Buñuel, em que ricaços se refugiam num cômodo de uma mansão acuados por “nada e por ninguém”, quem sabe flagelados da tragédia que eram suas vidas.
Talvez muitos de nós precisemos mesmo ver o fim das coisas pra então pensarmos sobre elas. Exemplos extremos costumam ilustrar com eficiência o nosso caricato modo de viver.

“Um dia sem mexicanos” tem um elenco desconhecido e um dos melhores que já vi na vida. Por que somos obrigados a ver sempre as mesmas caras? Que saco!!! Tanta vida, tanto frescor, tanta verdade... e o cinemão nos empurra goela abaixo o Tom Cruise outra vez, e a Angelina Jolie outra vez... e toda esta corja que deveria nos deixar descansar um pouco.

Pedi à estrelinha para que meu domingo fosse de sucesso. E foi. Compartilho da autoria das obras que admiro. São minhas e de mim ninguém tira! Viva eu! Parabéns pra mim!

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Freud à tirolesa

As pessoas em geral são esquisitas. Umas menos, outras mais, e outras muito mais!!! Muuito mais!
O normal então é ser esquisito. Os que não têm esquisitices é que são estranhos. Coitados.

Adoro observar as esquisitices das pessoas. (E as minhas devem ser observadas. Com certeza.) Vou começar a andar com um caderninho. É lamentável que as impressões que tenho da gentarada que cruza meu caminho se percam no meio das lindas tralhas da memória. Um dia ainda escrevo a minha “Comédia humana”.

Há alguns anos, logo que tinha mudado de aparamento, uma senhora rabugenta foi bater à minha porta. Dividiríamos a garagem e ela “queria porque queria” que o seu carro ficasse sempre na frente do nosso, porque ela não ia dirigir carro dos outros e não sei mais lá o que de palavrinhas espinhudas e um hálito de café e cigarro junto com cheiro de roupa velha. Muito esquisita, um cabelo preto preto preto escorrido, uns óculos gigaaantes, uns braços muito peludos que acabavam em mãos escondidas por anéis foscos e pulseiras coloridas.

E eu respirei fundo e disse: “Qual o nome da senhora?”. E ela respondeu: “Aracnéia, e o seu?!”...............................
Olhei pra um lado, pra outro, para trás... provavelmente fosse acontecer uma coisa muito esquisita que revelaria que aquela cena não passava de um sonho. A pausa deve ter sido longa. Neste intervalo ela ajeitou os óculos com uma mão e com a outra levou o toco de cigarro à boca para uma tragada inquisidora. Esperava de mim uma resposta.

_ Basta deixar a chave do seu carro conosco, Senhora

Não ousei repetir seu nome. Será que eu tinha entendido certo???? A senhora do fusca azul se chamava Aracnéia????
Não ia cometer a indelicadeza de arregalar os olhos e dizer indignado... “O que??!!!”.
Fui polido. Mas quem me conhece sabe que diante de situações delicadas eu fico mais gago que o normal. E o “Basta deixar a chave” não deve ter sido tão fluente. Deve ter sido algo como “a... se se ssssnhora p ... p... pode de.. de.. deixar... a chave!”.

Nem o Google sabe algo sobre esta mulher. Ou sobre este nome. Nem o Google. Nem...o...Google.

Dias após eu indaguei à vizinhança e sim, era mesmo o nome dela. E todos achavam que ela tinha o nome da cara e a cara do nome. Que coisa... (quando eu digo “que coisa” é porque estou com vontade de colocar a mão no queixo, perder o olhar e me aprofundar no assunto, mas não me alongo para que o texto não fique maçante.)

Tinha um cachorrinho preto, velho, barrigudo, feio, feio... feio de doer! Tinha um tipo de sarna que parecia não ter cura e andava sempre com aquele negócio de abajur na cabeça pra não ficar se coçando.
Ele parava na calçada, ela andava uns cinco metros e quando sentia sua falta, virava pra trás, sorria e o chamava.
Ele ia, passo, passo, passo, passo. Quatro patas, quatro passos. Um de cada vez. E o quarteirão durava uma manhã.

Ninguém está livre dos olhos alheios e dos julgamentos mesmo que bem humorados e inocentes. “Freud gostava de se vestir à tirolesa”. Quando li esta legenda numa foto de um livro sobre ele, eu ri muito! Que esquisito!! Ahaahh...
À tirolesa!! Ahahaha...

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

A Palmeira contra o banquinho

Que coisa esta vida...
Ouvimos o dia todo, todos os dias, que as coisas andam mal, que tá tudo muito difícil e que antigamente é que as coisas eram boas, que a humanidade se aproxima do fim e que não há mais solução.

E mesmo diante de tal panorama, plagiando nosso barrigudinho barbudinho, “nunca na história deste país”... se riu tanto. ( Será que isso também é obra do governo do PT? )

Não tenho estatísticas em mãos e esta impressão é baseada nos meus achismos... mas não devo estar errado.

A cada dia mais pessoas têm acesso à informática e à internet.
A palavra mais procurada no Google é “sexo”.
As pessoas costumam apreciar conteúdo erótico no computador quando estão sozinhas. As pessoas vivem cercadas de outras pessoas e vivem no computador. Não estão, portanto, vendo pornografias e afins o tempo todo. ( Vale lembrar que algumas até trabalham! )
O que estão fazendo então?

Estão rindo da Maísa no youtube !!!!!!!!!!!!
É claro!
“Maísa” deve ser a segunda coisa mais procurada no Google.

De qualquer forma, as pessoas talvez estejam sendo mais felizes. Minutos de felicidade, seja com prazeres sexuais - mesmo que solitários - ou rindo de bobagens, se somados, acabam dando muita felicidade.
Os chatos de plantão podem dizer: “Esta busca frenética e descontrolada pela diversão e pelo prazer efêmero revelam a verdadeira insatisfação do homem com a sua vida.”
E eu vou dizer: “Avôa jacu! Tô nem aí procê!”, como diriam Las Bibas from Vizcaya.

Isso de viver pra procurar a felicidade plena, serena, eterna e etérea pode ser uma roubada. Vai que a gente não encontra! Vai que é invenção! Vai que só funciona para alguns!

Tenho um amigo tão tonto que eu amo!!! Ele vive me manando diariamente links interessantes, e 90 % deles são de abobrinhas deliciosas. Não é, Tiago?!

Dias atrás teve a festa (imaginária?) do filho da Marisa Monte, a Maísa dizendo “Vaca é sua mãe!” pro Silvio Santos, e uma surreal cena de assalto em que um rapaz invade uma loja e ameaça o proprietário com uma enorme folha de palmeira... e este, acuado em frente à caixa registradora se defende com o banquinho em que estava sentado e consegue expulsar o safado. Se fosse num filme ninguém iria acreditar. É pra rir muito!
Sem falar das dezenas de gafes e tombos dos famosos e anônimos.
Eu confesso uma certa queda por cenas de pessoas caindo.

A internet tem mais coisas maravilhosas além do poder de fazer rir. Sim, tem! O mundo tá lá ( aqui ). Tenho até medo.
Mas não quero entrar no mérito da questão agora, consciência!
Me deixa só rir por hoje, vá!

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Com a macaca!

“Um fazendeiro cria galinhas e porcos. Num dado momento, esses animais somam um total de 50 cabeças e 140 pés. Pode-se concluir que a razão entre o número de coelhos e o número de galinhas é:”

E eu sei lá??!!
Deusolivreguarde!!! Eu passei uns três anos no cursinho pra entrar na faculdade. Aprendi bastante coisa... mas foi um saco! E achei que nunca mais fosse ter que estudar coisas chatinhas e difíceis outra vez!
E agora que me meti na história de prestar concurso tenho me deparado novamente com os numerozinhos que tanto me amedrontavam.

A razão entre o número de coelhos e galinhas é um banquete delicioso, oras!!!
Assados, fritos, cozidos... humm... Acho que só comi coelho uma vez na vida parece que era gostoso. Dizem que quanto mais meigo o bichinho mais saborosa a sua carne.
Mentira! Inventei isso agora! Rá rá rá... Imagina carne de golfinho, ou de coala?

Que meus amigos vegetas que não me ouçam ( me leiam )nem brincar com isso.

Prefiro mesmo fazer uma orgia gastronômica a ter que solucionar a questão de quantos pés vão pra cada bicho e a razão não sei das quantas!
Razão.
Que mania as pessoas têm de usar os mesmos conceitos para diversos campos!
Razão!
Daria pra pedir ajuda aos filosofets... Eles adoram falar das diversas acepções desta palavra. Alguns deles opõem a razão à imaginação. E eu aqui, na minha filosofia de brincadeira, fico retorcendo meus neurônios imaginando porque a matemática usa a “razão” sendo que ela é tão abstrata e ao mesmo tempo é lógica e real, e prática e conta com nossa capacidade de imaginar e... ai, ai, ai...

Lembro-me que no cursinho pré-vestibular tinha lá umas várias matemáticas e eu delirava... O professor pegava impulso e ia ladeira abaixo... passa pra cá, e este pra lá com sinal invertido e multiplica em “xis”, e simplifica e corta este com aquele e sem esquecer de resolver primeiro as potências... e tererê e burucutu e caixa de fósforo... e tcharam!! Pronto!

Pra mim nunca foi matemática. Era matemágica!

Ontem meu professor falando de torneiras e tanques e vazão não sei das quantas e no fim ele disse: “Pra facilitar você pode simplesmente fazer o seguinte: inverte, inverte, inverte, soma, e inverte o resultado!”... rá rá rá. Juro!!! Disse exatamente isso. E a classe riu!!! RSS.
Que bom, não estou sozinho nesta! Aleluia nóis tudo!

Quando me perguntam se eu gosto de matemática eu digo: “Olha eu gosto dela, mas eu acho que é ela quem não gosta de mim!”.

Acho a matemática linda. E acho que tem um ponto em que se aproxima demais da poesia, da arte, do que é divino no mundo. E isto de ser tão abstrata e tão concreta e real é o que mais me fascina. Pode ser que eu entenda tudo errado. Que não seja nada disso. Mas não importa. As coisas são o que vemos nelas e pronto! Me deixa!!!

Que saco!!! Ihhh.... (grunhidos!)
Tenho prova domingo e até lá vou serrar os dentes e grunhir muito!!!
Me deixa!

domingo, 9 de novembro de 2008

Ao ringue! E avante!

Mais uma vez o dia foi salvo pelo cinema.
Gosto da vida. Mas às vezes tenho a impressão de que gosto mais do cinema. Rsss... Ou talvez goste da vida porque lembre o cinema ou do cinema porque lembre a vida. Uma dialética deliciosa.

Com a maravilha dos infinitos canais de filmes da TV a cabo, acabo tendo contato com títulos que não passam por aqui. Com exceção talvez dos que pipocam na Mostra internacional de cinema de São Paulo. Mas muitos deles não entram em cartaz nem mesmo no circuito culturets de Sampa.

Como vejo uns três ou quatro filmes na semana fica difícil escrever uma quase resenha sobre todos eles dizendo o quanto me acrescentam e complementam o que o pão e água não dão aos meus dias. Mas vale a pena me esforçar e tentar.

Beautiful Boxer”, me deu bons momentos de felicidade. Mais um título que eu vou incluir na lista dos filmes para indicar aos que têm problemas com a própria sexualidade, ou com a sexualidade das outras pessoas. São filmes que todos deveriam ver... Os pais, os filhos, os que um dia terão filhos, os irmãos...
Devo tocar no assunto outras vezes e indicar mais títulos.

O que este filme tem de mais interessante e que o diferencia dos demais é que ele une universos antagônicos de uma forma deliciosa, delicada e com pompa na medida certa.

O que dizer de um adolescente em Bangkok que se percebe homossexual, que tem vontade de se transformar em mulher e que acaba por se tornar um lutador de boxe tailandês, sem, contudo, deixar as questões de sua sexualidade de lado?
Coisa absurda! De onde este roteirista tirou tal asneira? Quem poderia levar a sério este disparate de filme?!
Eu levei. E me deliciei. O filme é divertido e leve sem deixar de tratar com seriedade os sentimentos das pessoas e os seus conflitos. Surpreendente. De cara resisti, mas dois minutos depois relaxei e fui expectador: a minha função predileta em frente à tela do cinema. (no caso, da TV).

O curioso foi que hoje, domingo, 09/11, no intervalo dos meus estudos (sim, estou estudando até aos domingos!!) , eu comecei a ver um programa que adoro.. TABU. Que fala de... tabus, oras... Rsss... das diferenças entre culturas, ente pessoas que estão lá e cá dos meridianos, e às vezes sobre as diferenças entre quem está do lado de lá ou de cá da rua.
O tema deste dia era “Mudança de Sexo”. E blá blá blás super interessantes e tal. E chegam à Tailândia, Bangkok, e vão tratar do caso de um transexual que conseguiu o respeito das pessoas de uma forma diferente. Como fez isso? Percebendo seu talento para as artes marciais e se tornando lutador de Muay – thai. (Boxe - tailandês).

É mole?
Estavam falando do próprio rapaz do filme!
As cenas das lutas que eu tinha visto e que pareciam tão surreais eu agora estava vendo num documentário. Imagens gravadas há anos. O rapaz maquiado e acabando com seus adversários. Dezoito nocautes impiedosos.
Quando entravam no ringue, os adversários tentavam ridicularizar o rapaz todo delicado tentando beijá-lo no rosto. Ao final da luta ele, bem humorado e rindo à platéia extasiada, ia até o adversário e lhe dava uma bitoca.

Me fez pensar, mais uma vez, no mundo em que vivo. Um mundo em que as pessoas se importam com o meio ambiente, com a qualidade do ar, com o desenvolvimento sustentável, com o futuro das crianças, com as crises econômicas, com a violência... e ainda têm tempo de se dedicar a interferir na vida das outras pessoas. Têm tempo de se dedicar a atrapalhar a felicidade alheia. Saem de suas casas para votar contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo na Califórnia, fazem excursões a Brasília para fazer protesto contra a união civil de pessoas do mesmo sexo, enfim, dedicam seu tempo a aporrinhar a vida alheia. O que faz com que tantas pessoas tenham que entrar no ringue e apanhar e apanhar e lutar... e lutar. Um esforço gigante pelo direito de serem elas próprias.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Dois Bigo

Passei o fim de semana no interior matando a saudade da família. Fazia uns três meses que não os via. Teve formatura do meu sobrinho mais velho, teve escultura de papel maché, teve pizza, War, lavagem do carro com mangueira e direito e guerrinha de água - coisa impossível pra quem mora em apartamento. Teve passeio na feira, encontro com velhos conhecidos, sorvete que deixa a língua azul na pracinha e, por fim, a oportunidade de encher o pé de barro. Não poderia voltar pra casa sem essa, né?
Adoro barro. Rsss...

Passei a maior parte do tempo com meu sobrinho mais novo. O vejo tão pouco. Tô com medo que ele cresça e deixe de correr pra me abraçar, então tentei aproveitar.

Ri tanto!!! Demorei a conseguir explicar o que era irmã, primo, tio... rss... E ele também ria de tudo. O buraquinho no meio da barriga é “bigo”... e eu disse “É umbigo!”... e ele respondeu “Então dois bigo!”. Explicou-me a diferença entre sovaco e axila. Sovaco é quando é sujo, ( não depilado, talvez) e axila quando é limpo. O da mãe ele disse que era axila. Eu perguntei “E o meu, Rafinha?” “Hum... axila!” rsss... Deve ter ficado com pena de me magoar e dizer que o meu era sovaco.

Ele tá enorme, e me contou todo orgulhoso que já tava usando cueca “P adulto”. E assim que eu fui tentar carregá-lo, vi que não conseguia. E aí eu disse “É culpa da sua bunda P adulto!” E ele daaaava risada...
Fomos ao supermercado e ele queria ler tudo. E lia tudo mesmo, direitinho.

Minha irmã tava me contando que ele ouviu meu pai no telefone conversando e veio contar pra ela
_ Mãe, o vô vai comprar um terreno? Ele vai se mudar?
_ Não, ele tá comprando um terreno no cemitério.
_ Por que?
_ Porque já houve vezes em que a gente precisou fazer isso e fez correndo. É melhor se prevenir. Um dia ele vai morrer, eu vou morrer, você vai morrer.
_ Criança morre?!


Não deveria. Nem criança, nem mãe.

Ontem meu professor tava falando sobre atos administrativos impraticáveis e deu exemplos hilários. Entre eles um caso de uma província italiana onde o prefeito expediu um decreto proibindo as pessoas de morrerem porque não havia mais vagas no cemitério da cidade.
Que bom seria se fosse possível. E pra não soar tão absurdo a gente poderia restringir:
Não poderia morrer criança, e mãe só poderia morrer depois que os filhos já tivessem feito 40 anos.

Minha irmã e eu somos filhos de mães diferentes e as duas se foram. A dela quando ela tinha cinco anos, a minha quando eu tinha treze.
Vou sugerir que a gente apresente esta proposta de proibição de morte no congresso.
Acho que acaba sendo aprovada. Tanta coisa é!
Se o Estado tem que zelar pelo bem estar dos cidadãos, nada mais justo!

Mãe que perde o filho tem dores demais. E filho que perde a mãe “antes da hora” fica perdido pelo resto da vida. Para ambos eu acho que ocorre algo parecido com uma amputação.

Vou lançar a campanha e começar a recolher assinaturas.
Será que muita gente me acompanha?

O fim de semana em família foi maravilhoso. Eu, meus irmãos e meu pai nos damos muito bem. A gente só ri e se diverte quando se junta. Mas eu fico imaginando como seria se tivesse mais uma figura no meio desta festa. E imaginar é tudo o que eu posso fazer.
Que bom que sou ótimo em fantasiar as coisas como gostaria que elas fossem.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Bip

O tempo passa e a gente engorda, enrruga, mas continua mais ou menos a mesma pessoa. “Mais ou menos” porque além de nosso corpo se transformar - nem sempre pra pior - vemos e ouvimos coisas que nos botam um pouco mais pra lá ou pra cá. De certa forma somos o resultado da soma das coisinhas ou coisonas que já sentimos. ( Ui! ) O cinema faz muito isso comigo.

Ontem vi um documentário tão bonito.
Ando exagerando nos adjetivos de uns tempos pra cá, e agora “bonito” me parece algo tão novo, tão grandioso! Parece que é a primeira vez que o uso esta palavra. A medida certa para a ocasião.
O documentário de Irene Taylor Brodsky, “Hear and now” me fez viver mais um daqueles momentos do cinema que eu gostaria de compartilhar com todas as pessoas de quem gosto, mas que infelizmente, por falta de oportunidade ou de jacuzisse de algumas pessoas, acabo guardando só pra mim. Tem horas que me canso de tentar mostrar algo além dos filmes de sempre pra quem quer ver sempre os filmes de sempre. Que pena.

O documentário trata de um casal de senhores com deficiência auditiva que se submete a uma cirurgia para tentar ouvir o mundo. Ela no ouvido direito, ele no esquerdo. Detalhe? Tente descobrir.

O documentário apresenta conflitos que parecem ter sido importados de uma boa obra de ficção. E eu vou ter que me segurar muito pra não falar sobre eles! Tenho sempre um comichão que me cutuca nessas horas. Eu chego e digo: Não vou falar... Não vou falar... mas eu não aguento!!!! Respira, Leandro! Respira... Ai, ai, ai...

Há diversos momentos memoráveis no filme, mas um que me fez começar a choramingar aqui é quando o implante dos dois é conectado um mês após a cirurgia.
O médico aperta o botãozinho, diz "now", e a senhora dá um pulinho. O pulo de fora foi pequeno, mas o de dentro deve ter sido muito grande. Ela dá um pulinho e sorri. O mundo depois de 65 anos apresenta uma novidade assustadora a alguém que talvez não esperasse muito de sensacional nem dos dias nem das noites. Os olhos se enchem de água e a felicidade parece que vai escapar. E tudo o que ela ouviu naquele primeiro momento foi um “bip”.
Um “bip”.

Depois disso o mundo é outro. Inicia-se um novo período de somas.
As ondas têm som! O vento tem som!
Quem diria?! Quem iria imaginar? Nunca ninguém havia dito isso a eles!
Como puderam omitir? Como?!

Difícil para nós, que temos a sorte de ter nossos sentidos funcionando com eficiência, imaginarmos uma sensação como essa. Tô aqui tentando trazer esta coisa toda pra mim e me matando pra encontrar um exemplo que se aproxime, mas tudo de maravilhoso que conheço no campo das sensações parece pouco: a primeira vez que se come a carne com batata da tia Maria, ou o feijão da tia Eva. A primeira vez que se vê um quadro caprichado do Klimt, o centauro do Bourdelle, a suíte n. 1 do Bach, ou o primeiro “eu te amo” que o Rafa disse ao pé do meu ouvido.

Quando vivi estes momentos eu já tinha os sentidos funcionando a todo o vapor mas acredito que foram meus “bips”. Não chegam nem perto, imagino, do “bip” que baqueou a Sra. Sally Taylor, mas deram uma renovada no meu mundo. Foram fatores de alto valor na soma da minha vida.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Nós Bean

A tira da sandália arrebenta no meio da rua, e a calça rasga, e uma pomba nos elege como alvo de suas fezes, e a gente fica preso na catraca do ônibus...
Todos nós temos nossos momentos Mr. Bean. E algumas pessoas têm uma vida Mr. Bean. Ahahaha... Até em sonhos a gente passa por isso. Sabe aqueles sonhos em que a gente se percebe pelado na rua, ou que tá descalço e tal? Então...
Quando era criança tinha muitos sonhos assim... ficava apavorado, envergonhado, desesperado. Não era um momento nada “Bean”. Não era nada engraçado. Tadinho, maaaaagro, gago, envergonhado e pelado na rua. Não dá mesmo pra ser engraçado.

Uma amiga voltou esses dias de uma viagem à Europa. Passou uns dias borboleteando por lá. E lá estava ela toda faceira passeando por umas ruazinhas de Roma quando de repente apareceu uma daquelas vontades que não devem aparecer quando não se está em casa. Uma revolução intestinal, um levante pela liberdade!
Não havia nada por perto, nenhum café, nenhuma lojinha, nenhum boteco sujo que fosse! – Segundo ela não há botecos em Roma. Eu lá seria um homem triste!

Andando rapidinho, provavelmente em passos muito curtos, ela chegou ao metrô Círculo Máximo e lá foi procurar um banheiro. Encontrou. Havia um espaçozinho pra que se colocasse uma moeda em frente a uma porta de metal que se parecia com um elevador. Colocou a moedinha e a porta “blumpst”, se abriu. Era tudo lindo, de metal, as paredes de metal, o vaso de metal - design italiano de vanguarda! - e vários botões colorindo o ambiente. Ela entrou e a porta “blumpst” se fechou atrás dela. Meio claustrofóbica, meio desconfiada, foi cuidar dos seus afazeres por lá. Assim que relaxou uma voz muito alta começou a falar e dar instruções sobre o uso do banheiro hi-tech. Com o susto ela deve ter momentaneamente perdido a concentração, respirou fundo e continuou por lá. E a voz finalmente parou de italianar em altos brados. Ela suspirou aliviada. Mas então outra voz recomeçou tudo e agora em inglês!!!!! Jesuis!! Assim não dá!!! Revirou o zoinho, bufou e tentou se concentrar novamente. Aleluia. Terminou o serviço e foi procurar o papel higiênico. Não havia! NÃO HAVIA!!!!!! Um banheiro chique, que se auto-limpava com vapor em alta temperatura que não tinha papel higiênico!! Será que era pra ela esperar que o banheiro fosse higienizado pra ser higienizada junto?! Imagine a cena!
Bom, mas ela tinha papel na bolsa.
À sua frente havia um botão amarelo para abrir a porta, um azul pra soltar perfuminho no amabiente, um verde para a ventilação... (suspense) Ela se virou e havia acima do vaso sanitário um botão vermelho... Descarga, certo? Não havia nenhum outro botão... E ela, com as calças ainda no meio das pernas, apertou o tal botão vermelho...
Eis que a porta “blumpst” se abre!!! E começa a tocar uma sirene – segundo ela própria igual a dos filmes quando a nave vai explodir em 5 minutos – e muita luzes em volta piscando e um barulhão muito alto e ela ali.. durante 3 eternos segundos de calça no meio da perna ainda sentada no vaso e a gentarada do metrô passando pra lá e pra cá e olhando pra cara dela...

Deve ter sido uma pegadinha italiana. Só pode!
E até agora ela não recebeu nenhum comunicado pedindo autorização pra que a sua vergonha seja divulgada.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Cachorros e porcos

Os animais fazem mesmo parte da minha vida. No Orkut eu sou uma zebra, aqui sou um cachorro beijoqueiro, vivo rodeado de sonhos com animais, eles entram pela minha janela, às vezes me assustam de dentro dos portões quando eu tô caminhando distraído pela calçada... E até meu nome tem bicho: Leandro (homem leão). Tá pensando que sou pouca coisa???? Nem cachorro nem zebra. Leão!

Hoje gostaria de falar sobre duas expressões que eu tenho, nesses últimos tempos, tentado adaptar e adotar para a vida do dia-a-dia: “Não jogar pérolas aos porcos” e “Não chutar cachorro morto”. Na minha opinião são expressões que se complementam. Ao adotadas, nos conferem uma vantagem pouco maléfica, pois a primeira faz com que nos sintamos superiores, e a segunda nos impede de agir deslealmente em função desta superioridade.
Quantas vezes não somos pegos boquiabertos, pasmos, indignados com certos comentários ou certas perguntas? Arregalamos os olhos e a boca fica mole. Na cabeça passa o seguinte pensamento: “Não acredito que ele disse isso” ou “Foi assim que ela entendeu”?

As pessoas não precisam conhecer as mesmas coisas, não precisam pensar da mesma forma, concordar, enfim. Eu sei disso! Mas há situações em que a nossa inteligência é atacada descaradamente. Algumas declarações inocentes, outras muito perigosas. E vem aquela vontade doida de dizer a palavra mágica Catchanga!! e sumir numa nuvem de fumaça pra não ter que continuar a conversa.

-- Eu jogo lixo na rua às vezes porque do contrário os garis não teriam emprego!
-- Eu tenho peixes no aquário e passarinho na gaiola porque se eu os soltasse eles morreriam de fome!
-- Pode comer o bicho da goiaba. Ele é da própria Goiaba. É verdade!
-- Sabia que mortadela é feita de carne de cavalo?
-- Ele é negro, mas é legal! (neste caso “negro” pode ser substituído por “gay”, ou “gordo” ou “feio”.

Na falta da nuvem de fumaça a gente “faz a egípcia”, finge que não tá ali, que é invisível! Respiramos fundo e ainda tentamos com a maior das boas vontades, com muita calma e sendo amáveis... mas as coisas pioram e levamos mais uma martelada no zóio.

E aí que, combinadas, as expressões citadas no início do textinho nos são tão úteis. Fazem com que nos sintamos superiores e verdadeiramente nobres.
Pra ficar mais fácil é melhor ressuscitar o cachorro e juntar com o porco num único animal. Criando talvez um “porcorro” ou um “cachorco”. E darmos a ele não os restos de comida, porque isto seria desleal, mas compartilhar uma marca de ração da qual ambos gostemos. Quem sabe fazer um convite pra chafurdar logo ali. E talvez, numa hora dessas, dando voltas correndo atrás do rabo e rindo feito bobos, como quem não quer nada, a gente volte ao assunto e consiga algum progresso.

As pessoas, a maioria delas, podem melhorar ao longo da vida. Tenho um amigo que aos 15 anos se trancava com um gato na garagem para torturá-lo prendendo pregador de roupa na orelha do bichano. Hoje é uma das pessoas mais humanas, carinhosas e doces que conheço.

Procê ver!

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Calores

Ontem à noite, depois de uma discussão saudável, que acabou por não concluída, a respeito do filme “A massai branca”, fui pra cama tentar dormir. E os insetos do filme me perseguiram. Com o calorão que anda fazendo esses dias, ando dormindo de janela aberta, e os bichos - sempre presentes na minha vida - andam abusando da minha paciência.
Uma cigarra atrevida invadiu meu quarto!
Tenho um certo pavor de bichos desde que uma barata, lá pelos meus 15 anos, entrou no meu ouvido. (Fato que merece um texto especial, portanto não vou me alongar nisso). E lá fui eu tentar salvar a pobre da cigarra. Salvei? Acho que não salvei... assim... exatameeeente. Eu a joguei pela janela! E com um remorso que me é habitual, fiquei aqui do quarto andar olhando pra baixo pra ver se ela estava bem. (Preocupaaado)

Depois fiquei um tempinho enrolando meus caracóis: a pobre fica anos enterrada, se liberta, canta feito doida por uns dois dias, dá uma transadinha e morre! Isso é vida?!
Mas pensei: não deve ser uma transadinha qualquer, deve ser uma transada louca, intensa, com muita gritaria e asas batendo e faíscas iluminando o mundo!
Devem morrer de felicidade.
Até nós, humanos, depois de um coito de qualidade temos esta vontade boa de morrer, ou – menos trágico – de dormir pra sempre. Mas é uma coisa positiva. Talvez morrer seja uma sensação agradável. De alívio. Afinal, “viver é doer”, não é, Bandeira?

Pra nossa sorte, o coito perfeito não é o fim. Temos a chance de repetir. Temos a chance do “biscoito perfeito”, temos a oportunidade de incrementá-lo, e de conferir se realmente foi perfeito.
Como conferir? Como confirmar? Experimentando... experimentando... comparando.

A moça loira do filme se enfiou no meio de uma tribo Massai, no meio de uma reserva no Quênia, pra viver com um nativo. Foi incendiada por uma paixão pirotécnica!
Isso sim é que é se dar o direito de experimentar!

A nossa vida dura mais que a da cigarra. Mas ainda assim é curta.
O negócio é acender o rojão e se preparar pro estouro!

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Preludiozinho

O dia começa lindo com um Chopin(zinho) tocando bem alto. O Chopin tocando e um chupim cantando. Não. Não moro no mato.
Haveria alguma ligação entre o Chopin e o chupim?? Hum... Difícil, né? Mas seria material rico para um poeta. Dá até pra imaginar o músico polaco tocando seu piano e, posado à sua frente, o pássaro “azul violeta quase preto”- como bem coloriu a Wikipédia – acompanhando a música com seus acordes canoros. Aliás, poeta já é o autor da definição que diz também sobre o pássaro : “Seu vôo é digno e seu canto é lindo. Conseguem se comunicar com sua família e retribuir carinho através de gritos.”

Acho mesmo, sem ironia, que o autor da definição é um poeta. Mas não posso deixar de ter uma louca vontade de brincar com essas palavras. Mesmo porque acredito que é o que a poesia tem de mais rico: esse encontro incomum de palavras, de adjetivos que saltam do texto e fazem cócegas na nossa imaginação.

“Seu vôo é digno”. O que seria um vôo digno?! As empresas aéreas primam também por um vôo digno. Os indignos acabam em tragédia!!
No numdo dos pássaros eu acho que não há vôo indigno... Pássaro capenga nem voa... Para voar o pássaro tem que ter um design perfeito, tem que ter as suas formas em perfeita harmonia. Os vôos são precisos, pousam nos fios de alta tensão, no pico das árvores, apanham peixes dentro da água e seguem vôo como se estivessem apenas suspirando. A galinha e o avestruz não voam. A galinha até dá uns saltitos indignos e bate as asas.. mas xi... nada parecido com vôo, nada que um homem não faça com um pouco de treino (Que desrespeito à natureza da galinha! Perdão, galinhas!). O vôo é sempre algo imponente. Os que voam – com as próprias asas ou com as dos outros- se sentem sempre superiores aos que estão aqui no chão. Até a pomba, que tem um ar de pássaro pouco nobre, deve voar e dizer nas praças:”Me assusta e corre atrás de mim, criança ranhenta! Mas eu posso voar e você não! Ahahhaha”... só que o ahahahah delas é grulululuglululu grulululuglululu. Passam a vida a rir de nós.

E o que dizer de “Conseguem se comunicar com sua família e retribuir carinho através de gritos.”? Tenho umas vizinhas aqui que devem se adorar muito. São carinhosíssimas! Inclusive de madrugada. É tanto afeto entrando pela minha janela em carinhosos decibéis!
As pessoas deveriam levar isso adiante e tentar entender de outra forma os berros dos côjuges, dos pais, da irmã histérica, dos filhos adolescentes e ingratos – redundante este útimo exemplo, né? Adolescentes são sempre filhos ingratos!

Meu dia vai se seguindo. Os Chupins não me acompanharão durante todo o tempo, infelizmente. Mas vão deixar no meu dia um gostinho de piano voando elegantemente.
Vamos brincar de imaginar um piano voando elegantemente? E se imaginarmos o Chopin tocando piano voando elegantemente e gritando com o chupim e eles no maior bate-boca carinhoso que parece uma canção? Que legaaaaal!!...

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Adentrando...pé-ante-pé (Mataram mesmo o ífem?)

E clica e aperta e cola e copia e volta e avança e sofre tanto! E confirma senha e repete o e-mail e consulta código postal e digita dica de senha e são oferecidas 63 opções pra possível ocupação do usuário - o que constrange os usuários que não têm ocupação - e impede que se seja anônimo - a não ser que se digite no respectivo campo : "Anônimo de Lugar Nenhum”.
Uma dificuldade!
Pra criar este Blog tô penando! E eu nem sou um excluído digital! Imagina então o meu pai aqui levando a sério a história de “crie fácil seu blog!”
Ou não é fácil ou eu sou muito tchongo!

É sina... é sina!!
Sempre me enrolo nas coisas. E as coisas sempre fogem de mim. Tudo tem um caminho longo, umas complicações, porta fechada, link que não abre, página não encontrada, opção não habilitada, área restrita a assinantes.
Eita coisa!

E agora só de raiva eu vou ficar escrevendo “qualquer coisa”. Só pra atormentar.

Atormentar quem? Eu mesmo. Auto-punição. Coisa de solitário. Tem muitas coisas que faço com raiva e que acabam sendo boas pra mim. Vou pra academia e fico meia hora na esteira de raiva, levanto uns pesos, me entorto e faço careta de rai-va. Lavo louça de raiva e penduro as roupas no varal só de raiva.
Quem dera isto me levasse mais longe, hein?! Imagina só eu aprendendo outras línguas no tempo livre só de raiva! Terminando o interminável “Irmãos Karamazov” só de raiva! Já imaginou? Fazendo cócegas em gente mal humorada só de raiva da cara feia.
Os justiceiros são assim. Mais forte que o senso de justiça é a raiva.

Cuidado comigo, Blogspot! Se eu cruzo com você nas quebradas te dou uns catiripapo!!! Tá pensando que é quem pra dificultar tanto assim a minha vida?
Facilita as coisas aí e torce pra minha raiva passar!!
Já foi um sonho - não de desejar, sonho dormindo mesmo, sonho de desejar eu acho uma vergonha, a gente nem deveria compartilhar. Já tentou ser uma grife - exemplo de sonho que a gente não deve compartilhar. Já foi parte de um monólogo - que não foi encenado (continua no desejo, né?). Já foi assunto de tarepia, tema de conversa fiada com amigos e reflexões mil. E hoje vira brog, breg brega bloc ploc plets bubaloo!. As coisas tomam forma na vida. Sem que a gente controle ou se dê conta. Coisa de lôco!