terça-feira, 28 de julho de 2009

Pregos e Parafusos

Os dias dos pregos e parafusos são muito confusos.
Chacoalham nas caixas de ferramentas e às vezes se cruzam.
Martelos e chaves de fenda os amedrontam, fazem coisas horrendas.

O prego perdeu a cabeça.
Se apaixonou pelo parafuso cego.
Sortudos.
Foram deixados em paz a enferrujar suas vidas.

Os amores entre pregos e parafusos, são sempre profundos.
E vivem o tempo dos metais.
O tempo em que os amores duram mais.

sábado, 11 de julho de 2009

Betinha parte 1

Betinha. Betth. Elizabete.
Tinha 22 anos e já há um ano havia acabado a faculdade de letras.
Não tinha namorado e nem emprego. E isto não parecia afetá-la de modo algum.
Dormia bastante e os pais observavam que ela até então não tinha feito nada de especial na vida e não parecia ser capaz de grandes feitos.
Mas tudo estava bem. Raramente o assunto “Betinha que não serve pra nada” vinha à tona. E quando surgia, acabava se diluindo em outras balelas do dia-a-dia.

Um dia uma simpática vizinha sentada à mesa com Betinha e a mãe.
Eram 11 da manhã.
Filha tomava café e comia um pão. Tinha acabado de acordar. A Mãe escolhia feijão para o almoço.
Vizinha perguntou toda interessada:
Você fez faculade do que mesmo, Betinha?” - E a mãe se adiantou - “Letras” - “Ahn... E quem faz letras faz o que?” - continuou a vizinha. Betinha se ajeitou na cadeira e disse - “Ah, quem faz letras pode fazer um monte de coisa”- A mãe fez um biquinho e revirou os olhos pronta pra ironia - “Pode fazer um monte de coisa mas engraçado é que você mesmo não faz nada, né, Betinha?”

A vizinha fez cara de “Ih, toquei em assunto delicado” e Betinha respondeu com sua cara de “Nem esquenta. Tô acostumada. Ela não sabe o que diz”.
Pra você ter uma idéia, Luiza – Luiza era a vizinha – Nem namorado ela anda arrumando. Outro dia veio um rapaz super bonito, legal, gente boa, todo simpático aqui. Era amigo do irmão dela. O rapaz se derretendo pra ela e ela bocejando. Disse que tava com sono e pediu desculpas pro moço dizendo “Amanhã eu acordo cedo. Me desculpe, mas tenho que dormir”... “Mentira, essa aí acorda depois que todo mundo!”

As três riram bastante.

Este moço havia mesmo passado por ali e estava de olho na Betinha.
Quando ele tomou coragem e se aproximou um pouco mais, eles estavam sentadinhos no sofá vendo a novela, Betinha quase lhe enfiou um garfo goela abaixo “Quer mais bolo?” e depois encasquetou de bocejar sem parar pra ver se o moço ia logo embora. Ele foi e nunca mais voltou. O irmão tinha dito dias atrás que ele tava noivo de uma moça muito bonita lá da turma deles.

A Betinha perde cada oportunidade, Luiza!”

Betinha revirou os olhos, deu um pequena bufada e encerrou o assunto com um “Ô!” .

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Mundo da fofura

Eu nem pensava se era feliz ou não. Só ia vivendo.
Tinha doce às vezes, tinha brincadeira, tinha o Bozo na TV.
Aí o tempo passou e me ensinaram que a gente tinha alma.

E neste momento o mundo inteiro, que até então pertencia a mim, passou a ter que se espremer e ocupar o espaço do meu corpo, que era bem pequeno. Que chato.

Um tempo depois, mais um baque: cérebro.
Aquela história de alma era balela. A gente existe no cérebro.
Que aperto. Eu ia ter que caber dentro da minha cabeça.
Meu deus! Mal dá pra me mexer.

Ali eu tive que crescer, entender as coisas da vida. Aprendi que não se congela carne com batata e que não se toma seis yakults de uma vez.

Um dia, por um motivo ou outro, a gente acaba tomando um remedinho pra dormir melhor e viver melhor.
Maravilha!!!!

O nosso mundo é livre outra vez!!!!
Ele rompe a barreira do crânio, se espreguiça e sai pela vida. Dançando e rodando.
Que delícia!

Os olhos se fecham e logo surge a placa:

Seja bem vindo ao mundo da fofura!

Um mundo com cantos arredondados, onde tudo dá certo, onde a gente tem crises de riso e se debulha em caretinhas e poses para fotos abraçados com os amigos.
E tudo pode!

Pode voar?
Pode!

Pode correr até o vizinho tesudo e bulinar ele?
Pode!!

Pode ganhar na Mega Sena?
Pode siiiimmm!!!!

Dá a impressão de que pra ser feliz é só querer.
E a gente chega a acordar com o próprio suspiro.